MAIS UMA HISTÓRIA SOBRE A ODISSEIA EM MACAU,
1996
Da Índia, eu e minha esposa, depois de ter
deixado Goa, Damão e Bombaim, modernamente chamado Mumbai, seguimos para Macau,
no regresso a Sydney, Austrália.
O Aeroporto de Macau ainda não existia, e o
avião deixou-nos em Hong Kong, onde tencionava-mos estar um par de dias antes
de ir para Macau, o que só se fez no regresso. Porque ainda era relativamente
cedo e a luz do dia se prolongaria por mais umas horas, fomos directamente para
o cais de embarque, onde fizemos a reserva do hotel em Macau, e poucos minutos
depois tomamos o barco.
Ao desembarcar no cais de Macau, “Território
com Administração Portuguesa”, como o diziam, tivemos a primeira grande
decepção porque enquanto toda a propaganda turística estava escrita em
português, ninguém ali falava esse idioma, começando pelas autoridades de
controlo de passaportes e oficiais alfandegários, que deveriam ser
“portugueses”.
Já anteriormente, aqui comentei este caso.
Apanhamos um Táxi, as malas foram para a bagageira
e entramos pretendendo seguir para o hotel. Entreguei ao taxista o documento da
reserva feita e paga onde constava a direcção do hotel, mas o taxista apenas
falava (não sei se saberia ler) chinês e o documento estava escrito em inglês.
O homem incapaz de saber para onde nos havia de levar, à viva força queria que
saíssemos do carro com a bagagem, ao qual eu me recusei.
Depois de diversas tentativas do motorista
através de comunicação via rádio com a central dos Táxis sem ter tido sucesso,
passou-me o microfone para eu falar e tentar resolver a questão. Senti-me um
pouco mais aliviado com aquela iniciativa, e dei o nome e endereço do hotel em
inglês e português, mas incapaz de o fazer em chinês. Do outro lado, tudo que
eu conseguia entender, era que me deveriam estar a falar em chinês, pois os
sons eram semelhantes, e a situação ficou por resolver.
O pobre do taxista, por gestos, insistia que
nós o deixasse-mos para atender outros clientes chineses, mas eu já estava
decidido a não sair do Táxi a não ser à porta do hotel.
Passados uns 15 minutos naquele impasse, algo
deve ter brilhado na cabeça do taxista:
com o papel na mão, foi ter com um motorista
dum autocarro de turismo, e quando voltou, sorridente e satisfeito, leva-nos
para o hotel que ficava no dobrar da esquina, a cerca de 200 metros do cais e
ponto de partida.
Depois de acomodados, e quase 10 horas da
noite, saímos para jantar num dos muitos restaurantes cerca do hotel. Nova
dificuldade: tudo estava escrito em chinês. Nada em inglês e muito menos em
português. O que se entendia eram apenas os algarismos! Quis pedir informação a
um agente de PSP que policiava o local, que logo me respondeu antes de virar as
costas: “mim não falar português”.
Um escoteiro com os seus 12 anos de idade,
tendo na farda o emblema português e a palavra PORTUGAL, falava somente chinês.
A nossa sorte, que nos permitiu enganar o estômago, foi encontrar o McDonald’s
que já estava a fechar, e os dois últimos hambúrgueres que ali estavam
expostos, foi como o maná no deserto.
No dia seguinte encontramos um restaurante com
uma tabuleta tendo o nome do proprietário escrito em português, e o reclame que
dizia ”Serve-se arroz frito à portuguesa”. Entramos, deram-nos o menu onde
“ainda em português” e chinês, constavam os pratos que serviam, mas quando quis
fazer o pedido, as três moças que dirigiam o restaurante, nada entendiam do que
dizia-mos, nem nós conseguimos fazer-nos entender.
Valeu-nos uma jovem chinesa que estava a
jantar, que dando conta do que se passava, levantou-se da sua mesa, veio junto
de nós oferecendo a sua ajuda, bem preciosa, falando em perfeito português, o
que então nos surpreendeu.
A partir dessa ocasião, nos dias que se
seguiram passamos a comer as refeições no hotel,
Como turistas que éramos, com roupa de verão e
em calções, num dia de calor, caminhava-mos pela cidade quando ouvimos duas
senhoras muitíssimo bem vestidas, provavelmente “da fina-flor portuguesa ali
residente” a conversarem em português. Logo me aproximei, cumprimentei-as, e
para meu espanto, fui olhado com certo ar de superioridade e desdém,
perguntando-me o que eu pretendia delas. Perante tal snobismo e sumptuosidade,
pedi desculpa e seguimos o nosso caminho!
Mais tarde encontramos então outro indivíduo
que bastante alcoolizado que ia a cantar o fado, rua abaixo; Na livraria
portuguesa, ouvimos mais alguém falando a Língua de Camões, e entre eles um
sujeito já de certa idade, que proclamava ser um português exilado político do
anterior regime de Salazar, e que ali vivia há muitos anos. Pelos vistos era já
uma figura carismática de Macau, pois parecia ser conhecido por toda aquela
gente ali presente; no único Domingo que lá estivemos, fomos assistir à Missa
na Sé, em português, celebrada por padres chineses, e onde encontramos alguns portugueses
europeus, entre eles outra senhora que nos deu a conhecer um pouco sobre a vida
em Macau, sobretudo da presunção de alguns dos portugueses que mais
recentemente para lá tinham ido, e um cavalheiro que se prontificou naquela
tarde a mostrar um pouco mais daquilo que ainda não havia-mos visto.
Foi então que nessa segunda-feira seguinte, se
passou o acontecimento também aqui anteriormente comentado, de como fomos
recebidos no Centro de Informação de Turismo de Macau, pela única pessoa que
falava português, que por sorte ali tinha chegado na semana anterior. De outra
forma teríamos mais uma contrariedade pela frente.
Assim acabo de contar mais um e último
episódio da Surpreendente e Decepcionante Odisseia em Macau, terra que se dizia
Portuguesa.
Nota: O que aqui está escrito, não pretende
obedecer à “moderna ortografia brasileira”
Manuel da Costa
Sydney,
5-1-2013
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