O Órgão da Sé de Évora, o mais antigo em Portugal,
O PORQUÊ DE COMENTAR OU CRITICAR SOBRE DUVIDOSOS
OU PRETENSOS RESTAUROS DE ÓRGÃOS DE TUBOS, ANTIGOS OU HISTÓRICOS, PATRIMÓNIO
NACIONAL DE PORTUGAL, NAS MÃOS DE QUEM NÃO OS RESPEITA
Quando faço comentários ou criticas sobre
Órgãos de Tubos e ao que com eles se relaciona, é na convicção que poderei de
certa maneira contribuir para a protecção e conservação dum Património em risco
de profanação, ou da sua integridade, que se não for cuidado e defendido, se
torna uma perda nacional.
Após 1980, com o oportunismo em progresso e a
coberto das “amplas liberdades” então anunciadas, houve quem na sua ambição
desmedida e oportunista, se aproveitasse para procurar ser aquilo que não era,
mas queria ser. Sem possuir conhecimentos ou aptidão, procuraram conseguir
determinados lugares ou posições, capazes de cobrirem outros interesses.
Quero referir-me nesta crónica, se assim
poderei chamar, à formação de “organeiros à lá minuta”, reconhecidos e a
coberto de pretensos “consultores” não acreditados na arte da organaria.
Bons “falantes”, como sempre houveram, mas
péssimos conhecedores da matéria, da qual predominam as teorias, ocas de
prática. No entanto têm-se imiscuído e propagandeando-se em alguns presumíveis
“restauros”, efectuados e a efectuar, comprometendo a originalidade desses
Órgãos indefesos.
Quando um “consultor” não tem aptidão,
conhecimentos práticos para poder rectificar ou tomar qualquer decisão honesta
num trabalho de restauro, terá de confiar no executor. Não terá o mínimo de
escrúpulo em se certificar se o “organeiro” possui competência ou habilitação
comprovada no seu currículo, onde deve constar como fez a sua aprendizagem, o
tempo e a prática em que exerceu como profissional, e a experiência que possa
atestar a sua capacidade ou idoneidade, em trabalhos de Restauro.
Estes “Organeiros e Consultores”, conseguem
assim de mãos dadas e em trabalho de equipa, fazer o que muito bem lhes possa
apetecer, sem ter de dar contas a ninguém da qualidade e autenticidade do que
deveria ser um Restauro genuíno, quando não passa de uma reconstrução ou
reparação. Há ainda a agravante de muitas das vezes alterar irremediavelmente a
sua originalidade, e portanto o seu Crédito Histórico.
Conquanto anteriormente a 1965 esta prática já
existisse, estava limitada a carências de dinheiros para esse fim, o que até
certo ponto evitou que se fizessem mais estragos, além daqueles que haviam sido
feitos, com a comparticipação dos então Monumentos Nacionais, Departamento da
Cultura.
Desses factos, os mais antigos, tive
conhecimento pelos organeiros dessa época, António Vieira, Manoel Vaz Ferreira
dos Reis, e meu pai, Miguel Gaspar da Costa, com quem comecei a minha
aprendizagem. Dos casos mais recentes, fui tomando conhecimento através da
informação que os próprios “novos organeiros” iam dando das suas “habilidades”.
Foi nos anos 60 do século passado, quando não
havia ninguém com capacidade para o Restauro, e poucos até para a manutenção
desses Órgãos Antigos e outros mais que ainda iam funcionando, foi quando a
Fundação Calouste Gulbenkian através do seu Serviço de Música terá adquirido o
Órgão de tubos encomendado na Holanda, para a Sé Catedral de Lisboa, devendo-se
a iniciativa à então Directora, D. Maria Madalena Perdigão.
Começou também nessa altura uma nova época
para o desenvolvimento de restauros dos órgãos que em Portugal estavam em
precárias condições, tendo sido o primeiro e o mais antigo, o da Sé de Évora.
Outros se sucederam como foi dado a conhecer, fazendo parte de um projecto
estabelecido com a comparticipação da FCG, e que para dar continuidade, seria
indispensável haver alguém especializado na arte de organaria, que além de se
encarregar de futuros restauros a serem feitos no país, se encarregasse também
da manutenção dos já restaurados e dos novos entretanto adquiridos ou a
adquirir.
À falta de organeiros, a FCG enviou o então
único em Lisboa, conhecido por Eng. Sampaio, para a fábrica Flentrop, quando o
novo Órgão para a Sé de Lisboa foi ali construído. Este propósito não foi bem sucedido,
por a sua experiência não satisfazer as qualidades ou talento necessário para
ali continuar, não tendo sido recomendada a sua participação em projectos
futuros.
Fui encontrado por quem conhecia o meu
trabalho, relacionado com esses instrumentos ao longo de mais de uma década, e preferido
pelos conhecimentos e prática que já possuía, demonstrados e apreciados na
fábrica Flentrop quando lá dei provas para poder ser admitido como bolseiro da
Gulbenkian. Em 1970, no final de 5 anos de formação em Organaria e Restauro,
era em Portugal o único Organeiro especializado.
Em 1980, tive de sair do país por motivos já
dados a conhecer.
A partir dessa data, passados 2 anos e
aproveitando as “amplas liberdades” e oportunismos criados com o 25 de Abril,
onde competências e honestidade deixaram de ser apreciadas, alguém
completamente alheio ao que seria um órgão de tubos, mas porque por um curto
espaço de tempo se tinha dedicado a afinar pianos nas horas vagas, conseguiu em
“tempo recorde” de poucos meses, considerar-se Mestre organeiro, abrindo a sua
própria oficina, e ter restaurado já o seu primeiro órgão.
O que escrevo, não é novidade, sendo do
conhecimento de quem leu o que por ele foi escrito e publicado.
Interessante também, foi ter um pupilo que com
ele começou a aprender, e que rapidamente lhe “passou as palhetas”, quando mais
tarde toma conta de trabalhos que ao seu “mestre” não lhes foram confiados!
Imaginem alguém que vai aprender uma arte, com
quem nunca teve escola ou formação profissional capaz em Organaria, e muito
menos em Restauro, sem preparação ou idoneidade para ensinar, aceitar alguém
que se considerava a ele mesmo, como também publicou, um autodidacta e
habilidoso, ou um habilidoso autodidacta!
É assim que num espaço de tempo inconcebível,
se formam Mestre e Pupilo, em “exímios” profissionais, reconhecidos pelo Estado
e pela Igreja em Portugal, como “Mestres Organeiros”, com quem então começam a
“negociar”, com ou sem o apoio de consultantes da mesma casta.
Possuo documentação comprovativa do que até
aqui tenho escrito e dado a conhecer, que já despertou a “indisposição” de duas
das figuras que se sentiram atingidas na sua “dignidade”, como se dela fossem
possuidores. Esses, considero de “peixe miúdo”, e portanto fácil de manipular.
Um deles teve no entanto “coragem” para ridiculamente tentar ameaçar-me, não
porque eu o denunciasse mas por se ter sentido acusado!
Um outro, este já “graúdo”, que eu tenho na
conta de ser mais responsável, dada a sua posição e influência no meio em
questão, pessoa que eu conheço ou conheci bem, ou pelo menos julgava conhecer,
com quem tentei abrir discussão sobre organeiros no passado e actuais,
“escudou-se” não respondendo a uma carta que lhe enviei, onde lhe pedia para
ser informado sobre “o seu desconhecimento” da existência de organeiros desde o
início do século passado, que sempre foram ignorados, e os seus nomes ocultados,
em tudo que foi escrito e publicado a esse respeito.
No meu ponto de vista, revela-se numa
tendenciosa e acção suspicaz para ser beneficiado nos seus intentos.
Com outros dois, navegando no mesmo bote, as
desculpas dadas não conseguiram responder ao que lhes foi perguntado.
Durante o meu tempo activo, ocupado com os
deveres profissionais que para a Austrália me trouxeram para poder continuar a
exercer a minha profissão especializada de Organeiro, uma vez que em Portugal
não havia lugar para poder exercer cabal e honestamente essa especialidade,
aqui trabalhando arduamente mas com total satisfação, no fabrico de novos
órgãos e sobretudo no Restauro de muitos mais, não dispus de tempo nem de meios
que hoje se encontram disponíveis, chamados de “Internet”, para ter a oportunidade
de contestar o que no meu país, de mal se fazia e se faz, sobre o assunto em questão.
Dada agora à minha disponibilidade de tempo
após me ter aposentado, e com as informações chegadas até mim nestes últimos
anos, além de pesquisas feitas, não posso deixar de ignorar os interesses e
falta de consciência envolvidos em alguns desses “restauros”, que se não houver
alguém responsável e idóneo na arte de Restauro que tenha a dignidade e a
coragem de denunciar essas “negociatas desonestas”, estaremos a contribuir para
o descrédito do Património Nacional, onde os Históricos Órgãos de tubos estão
integrados.
Para colher na origem informações mais
fidedignas, sem ter obtido qualquer resultado por nunca receber resposta,
comecei por contactar entidades do Estado e da Igreja, como proprietários e
detentores desses referidos instrumentos que são Património Nacional, e não
propriedade privada de uma elite que procura pôr e dispor, como de coisa sua ou
propriedade pessoal se tratasse, não olhando a meios para alcançar fins.
O que encontrei, foi cumplicidade, a que
cheguei de apelidar de “Segredo de Estado / Igreja” associando aos tão
proclamados “Segredos de Justiça”.
Nem como Cidadão, que tendo deveres deve ter
também direitos, nem como Católico que procura manter e confiar na sua
convicção religiosa, poderá merecer tal falta de respeito e demonstrada
prepotência.
Felizmente que vivendo geometricamente muito
afastado desse foco de Corrupção que em Portugal se habituaram a viver, e mormente
pelo sentido da dignidade que sempre defendi, me considero imune ao contágio
desse esse "vírus".
Resta a esperança que possa haver uma nova concepção
de Justiça, esta na verdadeira acepção da palavra e conceito, que possa
destrinçar quem seja Honesto, daqueles desprezíveis que se aproveitam dum
Estado ou Governo, como da Igreja, para viverem à custa de um Povo, que se
sacrifica e que os está a “alimentar”.
Manuel da Costa
Sydney, 10 de Dezembro de 2014