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Sydney, N.S.W., Australia
Aos 12 anos de idade comecei como aprendiz com meu pai, na construção, reparação e afinação de Harmónios. Reparação e afinação de Pianos e Órgãos de Tubos. [instrumentos musicais] Aos 16 anos trabalhava por conta própria. Com 22 anos tinha a Carteira Profissional na especialidade de Rádio e Electrónica, que me permitiu trabalhar nos acordeões e órgãos electrónicos, amplificadores de som, e acumulei ao meu trabalho nos instrumentos, a manutenção do controlo electrónico das novas máquinas instaladas na “FACAR”, em Leça da Palmeira, Matosinhos. Aos 27 anos fui para a Holanda com uma bolsa de estudo onde me aperfeiçoei na Construção, Manutenção, Afinação e Restauro dos Órgãos Antigos ou Históricos. Trabalhei como Organeiro na Gulbenkian em Lisboa, de 1970 a 1974, e como Encarregado da Orquestra Gulbenkian, de 1974 a 1980. Em 1980 emigrei para trabalhar no restauro do "Sydney Town Hall Grand Organ". Em 1990 como "Mestre Organeiro" foi-me entregue, a conservação, manutenção e afinação daquele prestigioso Órgão, no qual trabalhei 31 anos, até me aposentar em 2011. com 72 anos de idade. Ver mais no meu CURRÍCULO.

Monday, February 25, 2013

NO MEIO SÉCULO DA ORQUESTRA GULBENKIAN

28-9-2012

NO MEIO SÉCULO DA ORQUESTRA GULBENKIAN

"MEMÓRIAS" DE UM ORGANEIRO PORTUGUÊS, QUE TRABALHOU COMO ENCARREGADO DA ORQUESTRA GULBENKIAN EM 1970 A 1980, ATÉ SE “REFUGIAR” NA AUSTRÁLIA QUE O ACOLHEU E LHE DEU O VALOR MERECIDO, E ONDE SE SENTIU REALIZADO PROFISSIONALMENTE, TENDO-SE APOSENTADO EM 2011 COM 72  ANOS  DE   IDADE,  TENDO  OCUPADO   UM   LUGAR  DE  PRESTÍGIO  EM  SYDNEY


    A MINHA “PASSAGEM” PELA FUNDAÇÃO CALOUSTE GULBENKIAN, EM LISBOA

Em 1964 estava a Fundação à procura de alguém com aptidão para dar assistência aos Órgãos de Tubos em Portugal, após a aquisição do novo órgão para a Catedral de Lisboa, e previsto o restauro de órgãos históricos em Portugal. Nesse tempo não havia ninguém com capacidade de o fazer.

Um dia fui abordado por um funcionário do Conservatório de Música do Porto, que eu havia frequentado, que tendo conhecimento do meu trabalho em pianos, órgãos e harmónios, me perguntou se eu estaria interessado numa Bolsa de estudo para a especialização no estrangeiro, em órgãos de tubos. Não perdi essa grande oportunidade, e fui então apresentado à senhora D. Ofélia Diogo Costa, pessoa muito conceituada no meio musical Portuense e da Fundação, que depois de me conhecer, foi com entusiasmo que deu conhecimento para Lisboa, que tinha encontrado quem reunia todas as condições necessárias e estaria interessado naquela especialização.

Aproveitando a passagem por Lisboa do senhor Flentrop, da fábrica de órgãos na Holanda e com quem a Fundação estava envolvida, tive uma entrevista com ele, tendo sido aceite todas as condições exigidas para essa Bolsa, e marcado o começo da minha “aprendizagem” na sua fábrica.

Durante os 5 anos de especialização na Holanda, passaram pelas minhas mãos o restauro do órgão da Sé de Évora, e dos dois órgãos históricos da Sé do Porto. O órgão do Grande Auditório, teve na sua construção a maior comparticipação do meu trabalho, sendo eu também o responsável pelo sistema eléctrico que dele faz parte.

A sua instalação no local onde se encontra e para o qual havia sido desenhado, foi feita sobre a minha orientação, assim como na sua conclusão assisti à intonação e afinação final, executada pelo principal dessa especialidade, da Flentrop, e com quem previamente eu havia trabalhado durante o tempo que me foi estipulado.

                                                                      *   *   *   *   *

No início de 1970, após a conclusão da Bolsa e dos órgãos da Sé do Porto, meu último trabalho como bolseiro, fui admitido como funcionário do Serviço de Música, onde fui integrado como organeiro, e me foi dada também como tarefa nos tempos livres, o cargo de Encarregado da Orquestra Gulbenkian, em conjunto com o respectivo Arquivo Musical.

Os tempos livres eram aqueles que não colidiam com as afinações e manutenção dos órgãos ao meu cuidado, novos e restaurados, assim como nas desmontagens e montagens dos órgãos que iriam ser restaurados fora do País, conforme os acordos estabelecidos com a Gulbenkian.

Os trabalhos relacionados com órgãos, ocupariam em média nessa altura, uns 4 a 5 meses por ano, sendo os restantes 7 a 8 meses ocupados com a Orquestra. Isto até 1974, vindo a minha situação a ser alterada pelos acontecimentos resultantes do 25 de Abril, quando me foi imposto que exercesse apenas uma das tarefas, neste caso a de maior percentagem em tempo, ou seja, ter de trabalhar unicamente com a Orquestra.

Esta situação manteve-se até ao final de 1979, quando tendo eu sido admoestado por defender a propriedade da Fundação, me indignei e aproveitei a oportunidade de continuar a minha vida profissional de organeiro, na Austrália.

Durante o tempo que trabalhei com a Orquestra, tive bons e maus momentos, quando tive de lidar com alguns dos seus instrumentistas de fraco carácter e pretensiosos, que tentaram sem  no entanto o conseguirem, que eu fosse um serviçal à sua disposição.
Outros, possuidores de dignidade profissional e humana, compreendendo o trabalho ingrato que eu tinha entre a Direcção do Serviço e a Orquestra, sempre me trataram condignamente, e franco entendimento, criando-se um apreço recíproco.

A certa altura, a minha relação com o Administrador do Pelouro da Música tornou-se crítica, quando me recusei a dar informações sobre o que se passava no meio da Orquestra, uma vez que o que ele pretendia saber sobre a Orquestra, nada tinha a ver com a actividade profissional. Como resultado da “falta de colaboração”, o ter sido recusado o meu pedido de regresso à minha profissão, não só referente aos órgãos, mas a cravos também.

Posteriormente quando me foi considerada essa possibilidade, era já tarde demais. Eu estava comprometido com a firma australiana empenhada no meu trabalho, e que já tinha tratado de toda a documentação para a emigração.

Devo acrescentar que antes de finalizar a licença sem vencimento pelo período de um ano que me havia sido concedida, dei a conhecer à Fundação que estaria disposto a regressar ao meu trabalho específico nos órgãos em Portugal, como reconhecimento e gratidão pelo que a Fundação tinha dispendido comigo e com minha família durante a Bolsa, se me fosse prorrogada por mais outro ano a licença sem vencimento, tempo esse que eu necessitava para recuperar o tempo perdido da minha profissão, nos 5 últimos anos de trabalho com a Orquestra.

Infelizmente ou Felizmente, essa concessão não foi considerada, e em contrapartida foi dada outra Bolsa a quem não possuía a mesma preparação e conhecimento. Simplesmente inacreditável, o que demonstra o pleno desprezo por quem com dignidade e lealdade não quis trair os colegas, fornecendo informações privadas de que poderia ter conhecimento, e que com o seu trabalho honesto e competente, dedicação, profissionalismo e lealdade, tinha servido aquela Fundação.

O começo do meu trabalho com a Orquestra, não foi de difícil adaptação, pois contei sempre com o apoio do então Director Artístico, o maestro Werner Andreas Albert que sem qualquer snobismo ou comprometimento para sua dignidade e posição artística, muitas vezes me ajudou nos trabalhos da colocação da Orquestra, quando muitos dos instrumentistas se recusavam a fazê-lo.

Sempre fiz o meu trabalho com responsabilidade, eficiência e dignidade, sem esquecer a gratidão que tinha para com a Fundação, e especialmente na pessoa da saudosa Directora do Serviço de Música, Dra. Maria Madalena de Azeredo Perdigão, por quem fui apreciado, e que viria a ser “saneada” pelos oportunistas da época “progressista” do 25 de Abril.

Ao seu sucessor, Dr. Luís Pereira Leal, devo-lhe a sua percepção pela ingrata tarefa que eu tinha com a Orquestra, e tenho a agradecer-lhe a confiança que depositava em mim, dando lugar a uma estima recíproca.

Posso aqui mencionar um episódio entre muitos outros, que poderá justificar essa confiança merecida:

Numa Semana Santa em que estava programado e anunciado um Concerto no Mosteiro da Batalha, com o Coro e Orquestra Gulbenkian, este esteve na iminência de à última hora ser cancelado, porque o pessoal que na Fundação estava encarregado do transporte e montagem dos estrados para acomodação dos coristas, se recusou a trabalhar por se encontrarem com direito a folgar nessa Quinta-feira Santa. Decisão tomada na véspera do Concerto anunciado. Direitos adquiridos e aprovados naquela ocasião pelas Comissões de Trabalhadores e Sindicatos.

O Director do Serviço de Música, e como tal, responsável pelo evento então comprometido, acedeu e confiou plenamente em mim, quando me prontifiquei e tomei o compromisso e responsabilidade para viabilizar esse Concerto, salvaguardando uma situação embaraçosa da qual não só seria prejudicial para toda a organização desse Concerto, como seria uma falta de respeito para com Público, implicando desnecessariamente o nome da Fundação Calouste Gulbenkian.

Com a ajuda de trabalhadores da Câmara da Batalha, que nesse próprio dia do Concerto, logo de manhã cedo estava com uma camioneta na Fundação,  fez-se o transporte de todo o material e instrumentos. Às 3 horas da tarde, chegada a Orquestra e o Coro, tudo estava pronto para começar o ensaio geral de colocação.

Para que tal fosse possível, o Encarregado da Orquestra não se importou de “comprometer o seu prestígio ou dignidade” quando trocando a sua roupa por um fato macaco, ajudou na carga e descarga de todo aquele material, e na montagem dos estrados, a par do pessoal camarário para o efeito ali disponível.

Talvez por esta e muitas outras actividades executivas que eu exerci, por na Holanda ter aprendido a trabalhar e perder aquele snobismo tão patente nos portugueses, tenha merecido a consideração e estima daqueles que em mim confiaram.

A minha frustração profissional como organeiro e a insatisfação de me sentir injustiçado, estava a levar-me a um estado crítico de depressão, o que só terminou quando eu em vésperas de deixar a Fundação, já com o Passaporte de Emigrante e Vistos de entrada na Austrália para mim, minha esposa, duas filhas e um filho, de 17, 11 e 5 anos, estava preparado a deixar o País no dia seguinte, se tal fosse possível.

Apanhado de surpresa, o Dr. Pereira Leal quando lhe dei conhecimento da minha intenção, não me deixou realizar os meus intentos, sem que para isso ele obtivesse para mim, uma licença sem vencimento que garantisse o meu retorno à Fundação, continuando assim o meu emprego, caso por qualquer motivo, até familiar, me visse obrigado a regressar a Portugal. Esta atitude jamais poderei esquecer e de lhe estar reconhecido.

                                                                    *   *   *   *   *                               

 Desde que cheguei à Austrália, já lá vão mais de 32 anos, sinto-me recompensado por tudo aquilo que o meu País me negou, e onde poderia ter perdido inclusivamente a saúde, devido à injustiça e à frustração profissional.
Aqui fui acolhido com dignidade e apreço, sendo-me oferecido o que o meu País não me quis dar, desperdiçando uma pequena fortuna na minha preparação.

Naturalizei-me em reconhecimento ao País que me deu a oportunidade de trabalhar e viver dignamente, de educar os meus filhos, proporcionando-lhes as suas formaturas, para que possam desfrutar de uma vida cómoda e feliz, assim como a todos os meus netos. Com a graça de Deus, todos nós bem sucedidos.

Presentemente com 74 anos, aposentado aos 72 mas sem pensão do Governo, posso dizer que vivo desafogadamente, sem luxos mas confortável, fruto das minhas economias resultantes do árduo e honesto trabalho durante 32 anos, empenhando-me em garantir a minha pensão de sobrevivência, ao contrário daqueles que nada fizeram, mendigando agora a sua modesta ou insuficiente pensão e sujeitos a um apertado controlo fiscal.

De Portugal, a terra onde nasci, tenho as minhas raízes, família e amigos, sinto Saudade da Juventude, da Educação e Formação que recebi, e a tristeza de ter de assistir ao estado caótico em que se encontra.

Manuel SARAIVA DA COSTA
                                                                  
Sydney, 28 de Setembro de 2012.


                                                               *     *    *    *    *

Lista de alguns dos nomes que ainda me recordo, de colegas com quem trabalhei e que mereceram a minha simpatia, respeito e amizade.

Serviço de Música:

Dra. Maria Madalena Perdigão, Directora
Dr. Luis Pereira Leal, Diretor
D. Fernanda Mascarenhas, Secretária da Direcção
Dra. Maria da Graça, Assistente de Direcção
Dr. Ferreira Martins, Tesouraria
António Cardoso, Tesouraria
Hélder Fernandes, Secretaria
Madalena Bravo, Secretaria
E outros de quem o nome não me recordo.

Orquestra:

Elias Arizcuren (violoncelista)
Maria Macedo (violoncelista)
José L.Corral Arteta (violinista)
António Ferreira (contrabaixista)
Ricardo Ramalho (1o. flauta)
Otílio Martins (1o. fagote)
Júlio Campos (tímpanos)
Emídio Coutinho (trombone)
Uns quantos mais nos naipes das cordas e sopros, cujos nomes de momento não me ocorrem.

AGORA RESTA A ESPERANÇA DE QUE UM DIA TODOS AQUELES, SEM EXCEPÇÃO, QUE COLABORARAM COM A ORQUESTRA GULBENKIAN DESDE O SEU INÍCIO EM 1962, POSSAM FAZER PARTE TAMBÉM DA SUA HISTÓRIA. NÃO SÓ O PESSOAL ARTÍSTICO, COMO TECNICO E ADMINISTRATIVO.
50 ANOS É UM PERÍODO RELATIVAMENTE RECENTE PARA PODEREM SER PESQUISADOS TODOS OS DADOS NECESSÁRIOS. NO ARQUIVO DA ORQUESTRA, DEIXEI DOCUMENTAÇÃO REFERENTE AO TEMPO QUE ESTEVE A MEU CARGO E RESPONSABILIDADE

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